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Pescaremos até quando?

 Três posturas humanas e o crepúsculo dos ídolos. Quer saber? Vou pro pesqueiro.


        Apenas UMA grande empresa estadunidense ostenta o recorde de preparar 300 milhões de filés de peixe beneficiados ao ano. Um bifinho para cada cidadão americano. Sem precisar falar de tantas outras potências e empresas.

        Um único desastre ambiental no Japão, em Fukushima, levou material radioativo a uma área equivalente ao território da China nas águas turbulentas do pacífico. Sem precisar falar de petróleo, gasolina e papel. Papel? Isso mesmo. Papel.

      Três principais fatores podem pôr fim a um dos prazeres mais antigos da espécie humana: a alimentação à base de pescados. Poluição, sobre-exploração e crença. Aí entra o papel.

  O crepúsculo dos ídolos vai se preparando há milênios. É conhecida a história da multiplicação de pães e peixes. Cristãos, judeus, islâmicos, hindus, as grandes tradições do livro, no geral, são permissivas com o comer peixe.  Jesus do futuro talvez reparta um salgadinho de milho. O deus-tubarão dos hindus corre o risco de acabar passando fome. E os muçulmanos e judeus, bom, esses só vão passar aperto quando a pecuária bovina se mostrar cabalmente insustentável, como insistem os ecologistas há pelo menos cinquenta anos. E profeticamente há uns três mil anos.

  Uma das atividades mais harmônicas com a natureza, a pesca, praticada em absolutamente todos os cantos do planeta desde tempos em que não havia escrita, encontra-se num ponto de ruptura importante. Ou nos convertemos cada vez mais à piscicultura sustentável ou talvez nossos bisnetos não saibam absolutamente a delícia de saborear uma manjubinha na praia de Santos. 

É curioso. O ser humano passa a ser dotado de uma desvantagem adaptativa com o incremento da moeda: implementar escassez. Veja: falta água numa enchente. Isso é emblemático. A ganância e o imediatismo nos fazem desperdiçar e ignorar coisas elementares. O aquecimento global e suas origens até hoje são contestados – e com razão, já que deve existir o contraditório até na ciência, com certos limites. Mas não se pode negar que o aumento populacional e as novas tecnologias põem em risco a água em todo mundo moderno.        Se a humanidade, esta entidade de razão, criada, artificial, tem o poder de degelar os andes e o himalaia, não se pode ter certeza, bem como sobre o real papel da camada de Ozônio. Isso num horizonte cético em relação às conquistas científicas. Mas é lição de terceira série que água e óleo não se misturam. É empírico que um copo de gasolina pode inutilizar todo um lago de peixes. Uma coisa é a postura cética, outra é o tão em voga “negacionismo”, antigamente chamado apenas de obtusidade.

    A saída para a escassez de pescados é a piscicultura, de quebra, no pacote, o ser humano leva o represamento de água potável. Menos fluxo para os baixios e pântanos, evitando transtornos como o que vimos no sul. Menos gente passando sede. Menos gado morrendo de sede. Menos planta secando no inverno. Agora é encontrar tecnologias sustentáveis para a piscicultura, como rações orgânicas, motores de oxigenação econômicos, tratamentos sem química pesada, fármacos biodegradáveis, mão-de-obra tratada que nem gente, pois como sabemos, ecologia é ambiental mas também social e mental. Esse papo já tá me estressando. Quer saber? Vou pro pesqueiro.


Lucas Furió é técnico em segurança do trabalho, professor de filosofia e artes e sobrevivente urbano. Tenta entender a eletricidade e faz uns rabiscos.

Comentários

  1. Sempre ouvi dizer que a pecuária era prejudicial e estava fadada à extinção em algum momento, no entanto, nunca imaginei que a piscicultura também estava incluída nisso. Acredito que o homem é capaz de tornar essa prática em algo sustentável, mas deve levar tempo até que essas sejam de fácil acesso e disseminadas pelo mundo.

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  2. Sempre ouvi dizer que a pecuária era prejudicial e estava fadada à extinção em algum momento, no entanto, nunca imaginei que a piscicultura também estava incluída nisso. Acredito que o homem é capaz de tornar essa prática em algo sustentável, mas deve levar tempo até que essas sejam de fácil acesso e disseminadas pelo mundo.

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  3. Ele fala sobre como a gente esta acabando com a pesca, algo que sempre fez parte da nossa história. Poluição, pesca exagerada, entre outros.
    Ele também fala sobre a ganância e como a gente é ótimo em criar escassez em abundância.

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  4. O texto fala sobre a importância de criar peixes em cativeiro para ter peixe para comer no futuro, porque os oceanos estão sendo muito explorados e poluídos. Também aborda questões como a relação entre o ser humano e a natureza, ressaltando a importância da ecologia social e mental, além da ambiental.

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  5. O texto nos alerta e mostra as consequências da atividade humana sobre a natureza, com o homem se aproveitando de seus recursos, mas sem pensar no que acontecerá com ela.
    O exemplo para demonstrar essa relação é a pesca, já que o homem se aproveita dos mares e rios para tirar os peixes que neles residem como alimento, porém no processo ele acaba com o ecossistema, tirando os peixes necessários para que ele funcione, além de contaminar seu habitat, fazendo com que não haja um futuro agradável , tanto para as águas quanto para o homem

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  6. Eduardo Silva 2-I
    O texto apresenta uma reflexão profunda e pertinente sobre a crise da pesca e a necessidade urgente de repensarmos nossa relação com os recursos naturais. A abordagem é abrangente, conectando a pesca a questões como poluição, exploração excessiva, crenças culturais e até mesmo a paradoxos como a falta de água em meio à abundância.

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  7. Texto muito interessante, realmente impressiona pensar como algo tão comum quanto o peixe no prato pode estar ameaçado por tantos lados — da poluição à cultura de consumo rápido.

    Achei especialmente boa a parte sobre a piscicultura como alternativa, com esse olhar mais humano e sustentável. Dá esperança pensar que ainda temos caminhos possíveis, desde que haja vontade e consciência, mas o problema é que isso possa demorar para isso acontecer.

    No fim das contas, é isso mesmo: repensar nossos hábitos e cuidar melhor do que a natureza ainda nos oferece.

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  8. Texto muito interessante, realmente impressiona pensar como algo tão comum quanto o peixe no prato pode estar ameaçado por tantos lados — da poluição à cultura de consumo rápido.

    Achei especialmente boa a parte sobre a piscicultura como alternativa, com esse olhar mais humano e sustentável. Dá esperança pensar que ainda temos caminhos possíveis, desde que haja vontade e consciência, mas o problema é que isso possa demorar para isso acontecer.

    No fim das contas, é isso mesmo: repensar nossos hábitos e cuidar melhor do que a natureza ainda nos oferece.

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  9. Arthur de Freitas Ferreira 2-I
    Boa tarde professor. Estarei enviando o meu comentário aqui só por garantia porém já o enviei alguns dias atrás no seu Teams
    Concordo com sua análise na questão dos problemas ambientais, principalmente sobre a piscicultura nos tempos atuais. As pessoas atualmente não buscam mais se preocupar com a vida animal, a vida da planta, nem mesmo com a sua própria espécie. Apenas uma coisa as interessa, e é a MOEDA. E infelizmente, não há escapatória; Há de dedicar no mínimo 15% de seu tempo de vida apenas no trabalho, se não, morrerás sem comida e um teto para dormir. Essa é a realidade da grande maioria das pessoas no planeta. E a consequência, o senhor citou no próprio texto: "A ganância e o imediatismo nos fazem desperdiçar e ignorar coisas elementares". A cada ano, as consequências das ações humanas vão ficando cada vez mais escancaradas. O mundo é frio e somos vítimas do sistema pútrido que só busca benefício próprio, e acredito que demorará muito para todas as pessoas acordarem e perceberem as os resultados da farsa que foi construída ao longo de nossas vidas, e até lá já será tarde demais

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